sexta-feira, 27 de julho de 2018

PINÓQUIO - Lecticia Dansa

por Inajá Martins de Almeida

30/12/2015. Quarta-feira. Amanhece. Chove em São Carlos. A cidade comporta-se cinza. O prateado da fina água chama atenção ao barulho que os carros provocam em suas poças no asfalto. Aproveitar o dia é tudo que ansiamos, afinal 2016 se aproxima. Chegamos aos trinta dias de dezembro.


Os pássaros se alegram. Cantam. Agitam-se. A praça se cobre de verde. As flores resplandecem suas cores várias.

Água. Vida. A chegada do ano promete surpresas. A natureza se abre à esperança. Eu me alegro. Planejo.

O livro em mãos me fala da magia. Lindo. Encantador. Pinóquio. Entusiasmam-me os versos. Volto à infância. Sinto-me criança. Danço aos versos de Letícia Dansa e passo a trovar:



Quem na infância
não pensou em travessura
não se sentiu criança
quando no tempo volta à leitura.

É Pinóquio que traz à lembrança
da casa dos pais o aconchego a embalar
belas histórias, sonho da criança
sonhos que se podem sonhar.

E passa o tempo e torna a passar
mas a criança que vive e sonha o livro
logo se põe a contar
lembrança do passado distante, tão vivo.

Livro que pudera encontrar
livro que fora encontrado
entre tantos na estante a clamar
- quero por ti ser abraçado.!

Agora é ele que passa a inspirar
sonho e poesia
da menina distante a sonhar
com fadas, varinhas... quanta magia!

O livro, leva-me escritor 
à magia que ele inspira
e ao olhar de leitor
as linhas logo aspira.

E percebe leitor amante
que fala suas páginas como se vivo fora
com boca, cérebro, narinas.

O livro respira!
O livro inspira!

Leitor descortina
as linhas do autor.

Desvenda seus sonhos ocultos
refaz sua veia de poeta
como sombras, vultos
vem segredar - segredos desperta.

Poemas que não tem fim as linhas embalam
como a ninar a criança
que renasceu em mim.

Letícia Dansa
dansa nos versos da leitora
que adentra a história
na melodia da rima dança...

Dança, Dansa, Letícia Dansa
baila, baila sempre a girar
o sonho da criança
a bailar.

Magia somente possível, quando o livro
se torna a ler
leitura que encanta
quando se aprende a fazer.

Saber ler é uma arte
descobrir sua beleza também
aprende-se a andar
não se distancia do falar.

Mas... é quando se aprende a ler
logo a escrever
que se dá a completude
a completude do ser.

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Esta é a leitora. Esta sou eu quando não consigo  me separar do livro. Aprecio-o. Estudo sua capa. Seus autores. Organizadores. Tudo me leva ao encantamento.

O livro fala. Bibliotecária que aprendi a ser, percebo o livro no seu conjunto. Aí a beleza da obra. Ler o livro no seu todo. Eis o segredo, razão porque ele se torna tão importante para quem o lê.

Penso no escritor "o Judeu" (Antonio José da Silva - 1705/1739)  e absorvo algumas passagens de suas décimas e que seja prudente o leitor, diante do meu sonho de criança:

Amigo leitor, prudente, 
Não crítico rigoroso, 
Te desejo, mas piedoso 
Os meus defeitos consente: 
Nome não busco excelente, 
Insigne entre os escritores; 
Os aplausos inferiores 
Julgo a meu plectro bastantes; 
Os encômios relevantes 
São para engenhos maiores. 

Esta cômica harmonia 
Passatempo é douto e grave; 
Honesta, alegre e suave, 
Divertida a melodia. 
Apolo, que ilustra o dia, 
Soberano me reparte 
Ideas, facúndia e arte, 
Leitor, para divertir-te, 
Vontade para servir-te, 
Afecto para agradar-te. 

http://www.fclar.unesp.br/Home/Pesquisa/GruposdePesquisa/Dramaturgia-GPD/OJudeu/aobra_teatrocomicot.pdf


Magnifico encontro Pinóquio, Lectícia Dansa, Antonio José da Silva. Passatempo alegre e suave pode compor singela melodia, para divertir quem escreve e agradar quem possa ler. 

Inajá Martins de Almeida - São Carlos 30/12/2015)

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Resgato livro neste instante e alma grita em júbilo. Meus projetos. Meu retorno aos textos. O passar a limpo o tempo investido, acrescentar novas linhas, aclarar outras. Tudo é possível quando se tem o registro na tela digital.

Aos poucos novo sentido vou encontrando aos meus momentos de isolamento nestas paredes deste local aconchegante. Meus livros organizados em estantes, meu piano que o posso tocar vez ou outro. Os sofás ornamentados por croches. Eis aqui um pedacinho de mim que vai tomando, cada vez mais aspecto do meu ser. 

Neste dia 27/7/2018 a lua em seu eclipse a dar espetáculo veio preencher este momento de puro lirismo e me fez retomar ao livro que tanto me inspirou e fora motivo de tantas linhas.   

PALAVRA POR PALAVRA - Anne Lamott

por Inajá Martins de Almeida

SOBRE MEU LIVRO INTERIOR

Poucos dias nos separam do ano novo. Logo mais estaremos em 2019. Novas esperanças. Novas perspectivas. Novos sonhos. Novas rotas apontam nossas expectativas.

"Palavra por palavra: instruções sobre escrever e viver" da escritora americana Anne Lamott, inspiram-me estas linhas. Estou em suas páginas derradeiras, prestes a uma releitura. Em muitas páginas posso me encontrar, quando me fala que suas experiências foram para o papel. 


Houve momentos em que julguei ser necessário apontar minhas próprias vivências, mas retrocedi. Afinal, pensara, a quem poderia interessar a não ser a mim mesma?   

[Hoje, 11/05/2020, ao reler estas palavras, sinto a necessidade de acrescentar outras. A frente deste computador, percebo o tempo passar; estamos de quarentena pela pandemia do corona virus - covid 19 - que acometeu a humanidade de maneira cruel, dizimando vidas, provocando pânico, trazendo a tona a política e seus politiqueiros de forma a mais insensata que se possa imaginar. Nos meus 70 anos jamais convivi com um tempo tão sem esperança quanto este. A fé tem me sustentado, e a muitos, embora estejamos apartados do convívio social. Não podemos nos tocar, não podemos nos visitar, não podemos trabalhar, enfim, nosso relacionamento está truncado. Estou aqui com meu livro interior aflorando minha mente. A tela do computador se abre a mim. O livro de Anne Lamott me traz perspectivas e recorro a suas páginas. É momento de escrever cartas, de se autoanalisar, de se perdoar; momento de rever espaços desarranjados, como o tenho feito de maneira a mais acintosa possível. Hoje, um dia após o dia das mães, sinto meu coração enternecido pela ligação de meu filho - como o esperei; como almejei ouvir sua voz. Fora um bálsamo para meu coração. Filho amado, sempre, querido e desejado. Este breve parêntese fora necessário. Outros virão, sem dúvida.]   

Também pensara em Lampedusa, quando nos dizia ser nossa obrigação a confecção de um diário - nossas memórias, mas é Anne que me inspira agora a estas linhas, complementa que a verdade de nossa experiência só pode ser revelada pela nossa própria voz (pág. 186).

"Se você não revelar o que está dentro de você,  
aquilo que não revelar poderá destruí-lo. E a verdade da sua experiência só pode ser revelada pela sua própria voz..."

Quantas vezes pedi a meus pais escreverem suas memórias, suas lembranças mais significativas, mas declinavam a cada rogo meu... Como eu poderei ter voz aquelas que já não se encontram mais em meu convívio e como minha voz terá sentido ante a quem vier a ler meus relatos; eu mesma não sentirei a veracidade daquilo que não vivi, apenas recebi em falas que se perderam ... 

Em outros capítulos me estimula a escrever 300 palavras por dia, pelo menos, mesmo sem inspiração, até que outras possam abrir caminho. Cartas também sugerem um bom estilo de escrita por serem pessoais e informais.

Assim, aqui estou. Não sei bem aonde as palavras vão me conduzir, mas o primeiro passo fora dado. Um novo ano se apresenta. São dias em branco para serem escritos e editados. Sei que tenho muito a contar e quero. Não tenho muito tempo a perder, afinal sei que não viverei outros sessenta anos mais, assim, aguardem-me!


Estamos, hoje em 2018 - 27 de julho mais precisamente... Ah como o tempo transcorre célere... Entre o pulsar do ano que se aproximava 2012 aos meses que transcorrem 2018, contam-se em anos seis e meses sete...


Então... 

Será que tenho um livro dentro de mim? 

Bom... Bem o sei que tenho. Ano passado Matilde, a prima, e eu levamos a lume o livro engavetado que meu pai me deixara - Álbum das Bandas de Araras. Já é concreto. 




Em 20 de julho de 2017 numa sensacional noite de autógrafos, nas dependências da Biblioteca Martinico Prado, entregamos aos munícipes ararenses, aquele que já é considerado o documentário o mais completo sobre as Bandas de Araras. 





"Você acha que tem um livro dentro de você?
Penso que todos nós o temos. Todos temos uma história - a nossa história - que poderia ser escrita. Quem dera pudéssemos registrar nossas lembranças em papéis; tirá-las da memória, do nosso mais íntimo e lançá-las nas linhas do tempo. Muitos o fazem. É possível.



Anne Lamott, nascida entre livros, num lar em que seu pai era escritor, acostumada fora às linhas, à escrita e jamais dela se apartou.





"Hoje em dia, a vida é bem mais complicada do que era na Idade Média, mas, sob vários aspectos, continua a mesma... entretanto, é muito recompensador saber que dentro de nós, ainda há uma parte boa que não foi corrompida e destruída, que pode ser resgatada e usada... no entanto, se você se importa de verdade com alguma coisa, essa crença fará com que você continue se esforçando para terminar seu trabalho".


O livro nos dá um desejo imenso de nos lançarmos de pronto às nossas memórias, à criação de novas histórias, novos personagens.

Direciona-nos à vantagem de que "escrever nos motiva a olhar a vida mais de perto" (p.10)

Meu pai me levara a escrita, incentivara-me a tal, entretanto, historiador, escritor que era sentíamos na pele os revezes que o acompanhavam também. 

A fluência verbal abria-lhe portas entre microfones, palanques, entrevistas, rádio, jornais, TV, ao mesmo tempo em que o lançava aos olhares sinuosos de contrários... 

Quantas lágrimas eu, a filha, vertera em bastidores das conversa que ouvia, das insinuações - não ... não almejara a vulnerabilidade que a escrita pudera me proporcionar.

Um dia, nos idos 1967, numa revista que meu pai editava - Revista de Araras - li um texto que escrevera em nossa viagem ao sul, em casa de tios e primos. Bastara para a partir daí meu nome figurar no sumário de todos os demais números - como estudante. Entretanto, jamais escrevi linha sequer. O anonimato me serviria de bastidor.

Até que, em 2005 meu nome viria a estar estampado num caderno nacionalmente visível: desta vez era o ENEM de 2005 que encontrara um texto no Amigo do Livro e o trouxera como motivador para a redação daquele ano. A partir desse momento, percebi que a escrita viera ao meu encontro e que o texto logo editado numa revista me fora um sinal de que deveria abrir-me ao universo literário, não importasse a visibilidade que fosse.

Assim, estes textos, resultado de encontros entre livros estão a me proporcionar satisfação inimaginável e, quiçá, poderei alavancar outras revistas mais, antologias, jornais e, meu próprio livro num futuro breve, afinal, livros me nortearam desde tenra idade, basta leitor, sentar e escrever...

"Escreva um pouco por dia... Faça de conta que são escalas de piano. Imagine que assinou um contrato com você mesma... Comprometa-se a terminar as coisas". (p.19)  

Bom, eu não tenho a pretensão de ser uma escritora, como muitas que existem no universo da escrita, mas penso que há algo que posso dizer e ser lida sim, quer em poemas, quer em situações do cotidiano, como crônicas - sim em prosa e verso gosto de me exercitar. Em meus blogs, quantos os tenho. Assuntos diversificados que se abrem. Já os perdi de vista, quantos.

Este estou a formatar gradativamente e confesso que tem me alegrado por demais poder voltar aos seus temas, seus títulos, agregar pontos em aberto. Inspirar-me em livros e escritores que nos apontam nortes para nossos gostos mais íntimos. Quero sim dar vasão a este lado que ficara num passado longínquo, resgatado nestes anos que ainda me sobrevierem.

Um pouco por dia, não mais que isso me basta para entretecer meus dias.

Realmente, seguindo sua fala buscar seduzir o leitor e compartilhar o da escrita dom com os demais.

Leitura gratificante.

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Lamott, Anne   -   Palavra por palavra: instruções sobre escrever e viver   /  Anne Lamott  [traução de Marcello Lino];  Rio de Janeiro:  Sextante, 2011.   

terça-feira, 24 de julho de 2018

AJUDA-TE PELA PSIQUIATRIA - Frank S. Caprio

reflexões por Inajá Martins de Almeida

Manhã fria em São Carlos. Quarta-feira 11 de julho 2018. Entre afazeres, trabalhos manuais, que muitas das vezes não consigo prosseguimento adequado, retomo a leitura... Instiga-me o livro de Frank S. Caprio - Ajuda-te pela Psiquiatria.

Percorro suas páginas... "Onde residem nossas frustrações? As páginas 209/211 nos alertam sobre os males que acarretam essas frustrações. O "conhecimento íntimo"- abstraio da leitura - é o que pode nos desvencilhar dessas mazelas. Quantas vezes nos encontramos em querer ajudar as pessoas, o mundo, mas não nos observamos; não nos damos conta de que podemos ser "cegos guiando outros cegos"; "vemos homens como árvores" e assim estamos sempre a buscar alguém que nos lance ao tanque, como o cocho de Betesda, há mais de trinta anos paralisado, curtindo sua solidão e desamparo. Buscamos, quantas vezes, desculpas para nossas questões pendentes e, na maioria das vezes, trazemos para nós mais culpas - des-culpas (dez culpas), quem sabe.

Fora a leitura que me levara a minhas conjeturas também... Pude me atrever às linhas agregando outras tantas leituras, numa releitura que se quer registrar...

MINHA BUSCA DA BELEZA - Rollo May



por Inajá Martins de Almeida
sábado, 7/7/2018 - escrevo...



" ... a beleza nasce do ato lúdico, enquanto se brinca".(Schiller - p.49)

"O ato lúdico é a única atividade em que a fusão interior e dos fatos objetivos se realiza. Dessa fusão procede a forma viva que é a beleza. Essa forma vivente é vital, animada, dinâmica; e ao mesmo tempo ela dá serenidade, sossego, como por exemplo, na música... "
"O ato lúdico une o mundo interior de nosso devaneio pessoal ao mundo exterior das pessoas e da natureza".(p.49)



O livro inspira-me; eleva-me aos meus devaneios concretos, porque o exteriorizo por meio destas linhas, que se tornam presentes ao meu sentir, e, futuro, a quem vier encontrá-las, quer em rascunho a punho, quer na grande galáxia internet a qual deposito esses apontamentos.




Em 12/7/2018 retomo meu caderno de anotações e escrevo:

O inverno nos encontrou. Manhã gelada na cidade de São Carlos. O quarto respira a brisa úmida que adentra janela entreaberta. Amanhecemos entre as cobertas quentes, Mel a nos direcionar à sua alimentação matinal, o cafezinho quentinho com seu aroma e cheiro peculiar sendo preparado por Élvio, que não se  roga ao entregar na cama a cada manhã.

Livros sempre a me rodearem, a me conduzirem tempo e espaço, numa companhia que se faz sentir, acalentando de forma a mais profunda meu existir. 

Rollo May com seu "Busca da Beleza" instiga-me em suas páginas, a maneira como conduz suas memórias, desvendando a nós um pouco de si, levando-nos, quantas vezes a nos irmanarmos no contexto e, juntos, viajamos por lugares que, embora jamais conhecidos, tornam-nos tão familiares - escritor e leitor se fundem, completam-se, dialogam entre si e passam a se escrever, cada qual em sua época, em seu local, sem ao menos jamais terem se encontrado. 

Assim é que os capítulos se aventuram aos apontamentos: quero-os neste caderno - agora neste espaço cibernético também. Transcrevo partes, frases dentro do contexto que adentram meu sentir: - A Beleza e a Morte; julguei passar adiante, mas, rendi-me à escrita poética do autor a citar outros tantos que lhe vieram emprestar trechos ao tema que se abria, porque realmente todos já passamos pela lembrança da morte de alguém próximo e, a nós mesmo, um dia desconhecido, será concedida essa experiência, assim, cedi à leitura e, passo a passo caminhei e me envolvi:

"Os artistas... são as pessoas que criam coisas que perduram para além da morte". p.83


E segue e me faz seguir e absorver a citação de Spinoza em sua Ética:


"A existência de uma coisa não pode ser explicada pela duração ou pelo tempo, 
mas somente por esta qualidade da eternidade". p.84

Penso no escritor. Seríamos todos, pois, escritores? Afinal, se vamos à escola aprender a ler e escrever, o que faz, há muitos, se distanciar da leitura e, principalmente, da escrita. Bom... conjeturas a parte, quem sabe retomemos em algum momento. Ah! Escritor...

Volto às primeiras páginas do livro em questão e é quando "um escritor chega às portas do Céu, o qual, levado à presença de São Pedro, é acusado por este de "simplificar demais..." p.11. E penso, em meu questionar e me visita Fernando Pessoa com o que abstraio sendo o poeta um fingidor, que consegue fingir a própria dor. 

Seria realmente isso? Seria, então, por esta razão que não se busca pela escrita para não ser acusado? Ser visto? Criticado, copiado ou outros tantos mais? E me rendo à escrita e me entrego a auto interpretação em que o autor figura-me como aquele que, ao me encontrar, em meio a milhares de títulos dispostos em estantes bem organizadas daquele sebo "Outros Contos", da bibliotecária cuidadora pelos livros que comercializa, passa a enlevar-me através das linha que ao mesmo tempo que leio, passo a ser partícipe do contexto, quando me percebo entre as linhas - não mais leitora, mas aprendiz de escritora... 


"Outros Contos" é uma casa em seu formato externo - templo do conhecimento para muitos que a buscam. Percorro ávida pelo encontro de algum título, autor que venham saciar minha sede pela leitura que afete meu ser. Salas amplas, estantes nas paredes, mesas e cadeiras, sobre janelas que se abrem à rua, sofás se debruçam a preencherem harmoniosamente espaços em que podemos nos aconchegar, avançar os títulos e nos permanecer enlevados aos temas, às leituras e, quiçá, torná-lo nosso.  

Extasio-me ao inesperado, tão esperado - Rollo May, conhecido nos era, já nos desvendara "O Homem a procura de si mesmo", agora, pois, encaminhara-nos à Beleza e nos propõe "a dimensão artística de nós mesmos e os seres humanos sobre os quais lemos alguma coisa".


Lembrei-me assim e não me privei ao registro, de um comentário pela internet, o qual chamou-me especial atenção donde devemos, por um momento, quem sabe, parar com tanto nos encher de títulos, mestrado, doutorado, especializações e sairmos a cultivar as praças, as flores, as pessoas, conversas possíveis e sobretudo, ler Manoel de Barros; este último, contudo,  fora interessante, uma vez que encontramos um livro seu, jogado na rua e dele nos apropriamos, para casa o trouxemos e fomos ao encontro em saber que era esse que nos teria legado suas "Memórias Inventadas" e encontramos o autor mato-grossense que, menino Manoel, fora levado aos estudos e aos livros e, em suas especulações, ao sentir e pensar que grandes estudiosos e eruditos pudessem se esquecer do trivial que a vida proporciona, encontra Albert Einstein a dizer que:


" a imaginação é mais importante do que o saber"

Foi aí que se deu conta da soberania de Deus em sua engenharia e que, ao homem, não lhe é concedida a soberania nem para ser um "bentevi" - p.153 Memórias Inventadas _ Manoel de Barros

Assim é que o relógio avança o tempo e, nesta manhã fria, o sol se levanta e aquece o espaço; os afazeres me clamam à realidade; logo mais aula RASC, mas, antes, um retoque me é significativo para a inspiração que me fora alcançada:

"precisamos enfrentar a história da cultura em que vivemos, nos movemos e existimos. É esse não ver as coisas em sua dimensão artística que nos tem feito cegos aos perigos de nosso crescimento fenomenal... ademais precisamos enfrentar nossa própria arte pessoal, seja qual for. A Arte tem sido a auto-interpretação dos seres humanos no decurso da história"... Rollo May p. 13

Assim, transbordando em ideias, inspirando-me através das palavras dos autores e poetas, posso deixar o aconchego desta cama, abandonar os cobertores quentinhos e partir à caminhada que se abre a mim. 

Repleta por boas inspirações, para enfrentar a lida, encerro em agradecimento o acordar mais uma manhã, entre o café aromático e amoroso que me fora servido, as leituras dos livros que os tenho ao redor e que tanto puderam inspirar estas linhas, as quais retornarei em outra manhã. Obrigada Deus.

21/7/2018 - sábado
Após noite agitada, em que a cabeça latejava em dor constante, o comprimido me levara ao alívio e sono. A tensão, estresse dos últimos acontecimentos - doença de Élvio, contratações jovens RASC - desencadearam tensões em meu físico.

Amanheço livro em mãos. Rollo May continua instigar-me. Suas páginas recheadas de questões, gritam-me; levam-me a outras tantas páginas. Horas infindas as imagino numa frase:

"aja como o criador de uma estátua que tem de ser feita bela... " - Plotino  - cap. VIII

Palavras soltas o texto me revela e me aproprio...

"encontrar forma no caos..." - p.141; 
"a forma é a estrutura não material de nossas vidas, à base da qual vivemos e sobre a qual baseamos nosso próprio caráter particular". p.142

Mais além...

"a gente está sempre, subconscientemente, no processo de desmanchar alguma coisa em nossa imaginação, e de repor, em seguida, tudo em seu lugar... 
Ora, tudo isso é uma construção de forma... A forma dita o conteúdo"... 
[Assim...]
 "Há um perigo em se suprimir o caos com demasiada facilidade, pois, com isso, se remove o estímulo..." - p.144
Imagino, pois:

caos -  estímulo - imaginação - criação - forma

caos =  fator

estímulo =  gerador

imaginação =  motivador

criação =  instrumentador

forma =  realizador

O caos a se pensar na Criação do Mundo, donde: - A Terra era vazia e sem forma... Penso no artesão, o novelo de lã, linha. Fio que se mede, que se pesa - inerte numa caixa, numa estante. Sim, o caos entre tantos novelos, tantas cores, daí o estímulo para se criar. 

E o desmanchar o que tecido fora - ponto a ponto - encontra o artesão sua frenética busca pela beleza, pelo gozo do prazer em se tecer e admirar o que está a tecer; assim, há que se agradar primeiro artesão, artífice de sua obra, para, depois, tornar público sua criação, quer sobre a mesa, adornando corpos, em fotos, em fatos. 

Assim é pois que o caos gera sentido e faz sentido e se irmana ao Criador e gera dor de toda beleza que se pode ver, sentir, imitar. Sim... porque

"A Terra era vazia e sem forma, mas o Espírito de Deus paivara sobre o caos"...

Posso, a partir desse momento, encontrar-me no emaranhado confuso de pensamentos, em que, por algum momento, o caos me fez companhia, mas, a partir deste instante, a imaginação pode levar-me além das páginas escritas por Rollo May, para as minhas próprias escritas. 

22/7/2018 - domingo

O vento frio da manhã adentra janela entreaberta e nos encontra no aconchego entre cobertas. Amanheço livro. Os capítulos percorridos entre temas, aguçam minha mente que se vai longínqua, entre memórias - lembranças, quantas fugidias; saudade que se lança no vazio, em busca dos personagens que não se encontram mais presentes.


Rolo May consegue penetrar profundamente nosso interior e dele extrair nosso sentir que aflora. O culta a beleza, as aulas de Dona Carminda a nos levar a distinguir o Belo. Sua entonação marcante, elegante, seu sotaque português, penetrante, loquaz, soa-me ainda agora decorridas décadas desde 1970 até 2018.

A beleza que minha mãe, a meus olhos de filha deslumbrada, transmitia-me seu porte, gestos, maneira de falar, de cativar, de agradar, de receber, de partilhar. Seu sorriso, sua aura angelical sempre em lembrança presente. 

Ah o escritor... Passa a nos desvendar, enquanto desvenda-nos; lança-nos em salas, como terapias e nos revelamos... Em nós descortinam bastidores que se mantinham incógnitos, guardados em chaves e afloram sentimentos tais que avançam o palco em júbilo, em brados e louvores e abrimos gavetas e buscamos memórias que nos ilustram.

Minha mãe... O drama da perda da primeira filha, a morte que lhe rondava, soberba, fria, maldosa, enganosa, jamais lhe fora intimidadora. Vencia batalhas, fortalecia-se a cada percurso.

Meu pai... Sempre presente, combatia o combate, entre livros, linhas que declinava, escrevia o roteiro dos anos por virem - e vieram, viveram, sobreviveram, venceram.

Jamais encontrei pai e mãe a reclamarem, blasfemarem as perdas, mas os encontrava sempre alegres a eleger a vida, os dois filhos que anos depois almejaram trazer à vida; eram os anos em aberta comunhão, um dia vivido por vez. O agradecer ao findar do dia; o agradecer e se entregar ao raiar do sol.

Tudo isso me tornou observadora, embora, quantas vezes, a pouca idade, a infância, a adolescência não me proporcionaram o devido preparo ao entendimento do presente que me fora os pais. Entretanto, ainda que no avançar dos anos, em que a ausência me cala profundamente, reconheço o quanto o Criador me fora gentil ao me direcionar os pais, irmão, enfim a família que nasci.

Como é gratificante poder em idade avançar no tempo; tempo que nos propicia amadurecimento e entendimento.

O acompanhar em médicos, quando adoeciam, as experiência que adquirimos deles, tudo a nos compactuar a beleza de se poder admirar o por do sol, o raiar do dia; ouvir o murmurar das águas, dos pássaros em seus trinos, o roçar a terra, sentir o cheiro de relva molhada. Quantas manhãs... O balançar da corda dependurada  no galho da ameixeira. O fruto amarelo, doce, suave a molhar o rosto quando a explodir na boca.

Doce lembrança meus pais me proporcionaram. Minha infância... O regaço quentinho de minha mãe a me oferecer seu colo, quando me via acabrunhada. Meu pai a chegar do trabalho sempre nos presenteando com seus chocolates - e a gaveta da cômoda se enchia pelos tais; éramos comedidos na gulodice - a mãe orientava-nos à tal, assim, havia fartura todos os dias...
 Bom fora transportar-me aos anos de infância. A janela em noite fria de junho. O céu pintado de balões mesclando-se as estrelas as quais podiam-se ver entre a estrela d'alva, o cruzeiro do sul, as três marias... Hoje não mais as distinguimos, só em nossa imaginação. As luzes da cidade ofuscaram o brilho natural do firmamento.



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VIDEOS SOBRE ROLLO MAY E SUA PSICANÁLISE EXISTENCIAL


https://www.youtube.com/watch?v=Trzta8kjwRg - SER-NO-MUNDO

https://www.youtube.com/watch?v=ixwyQkdxYUo - ANSIEDADE E CULPA

https://www.youtube.com/watch?v=DnNNW1TLEPg - CUIDADO, AMOR E VONTADE

https://www.youtube.com/watch?v=dKKkKQ-vQE0 - PSICANÁLISE HUMANISTA EXISTENCIAL