por Inajá Martins de Almeida
sábado, 7/7/2018 -
escrevo...
" ... a beleza nasce do ato lúdico, enquanto se brinca".(Schiller
- p.49)
"O
ato lúdico é a única atividade em que a fusão interior e dos fatos objetivos se
realiza. Dessa fusão procede a forma viva que é a beleza. Essa forma vivente é
vital, animada, dinâmica; e ao mesmo tempo ela dá serenidade, sossego, como por
exemplo, na música... "
"O ato lúdico une o mundo interior de nosso devaneio pessoal ao
mundo exterior das pessoas e da natureza".(p.49)
O livro
inspira-me; eleva-me aos meus devaneios concretos, porque o exteriorizo por
meio destas linhas, que se tornam presentes ao meu sentir, e, futuro, a quem
vier encontrá-las, quer em rascunho a punho, quer na grande galáxia internet a
qual deposito esses apontamentos.
Em 12/7/2018
retomo meu caderno de anotações e escrevo:
O inverno nos encontrou. Manhã gelada
na cidade de São Carlos. O quarto respira a brisa úmida que adentra janela
entreaberta. Amanhecemos entre as cobertas quentes, Mel a nos direcionar à sua
alimentação matinal, o cafezinho quentinho com seu aroma e cheiro peculiar
sendo preparado por Élvio, que não se roga ao entregar na cama a cada
manhã.
Livros sempre a me
rodearem, a me conduzirem tempo e espaço, numa companhia que se faz sentir,
acalentando de forma a mais profunda meu existir.
Rollo May com seu
"Busca da Beleza" instiga-me em suas páginas, a maneira como conduz
suas memórias, desvendando a nós um pouco de si, levando-nos, quantas vezes a
nos irmanarmos no contexto e, juntos, viajamos por lugares que, embora jamais
conhecidos, tornam-nos tão familiares - escritor e leitor se fundem,
completam-se, dialogam entre si e passam a se escrever, cada qual em sua
época, em seu local, sem ao menos jamais terem se encontrado.
Assim é que os capítulos se aventuram aos apontamentos: quero-os neste caderno
- agora neste espaço cibernético também. Transcrevo partes, frases dentro do
contexto que adentram meu sentir: - A Beleza e a Morte; julguei passar adiante,
mas, rendi-me à escrita poética do autor a citar outros tantos que lhe vieram
emprestar trechos ao tema que se abria, porque realmente todos já passamos pela
lembrança da morte de alguém próximo e, a nós mesmo, um dia desconhecido, será
concedida essa experiência, assim, cedi à leitura e, passo a passo caminhei e
me envolvi:
"Os artistas... são as pessoas que criam coisas que perduram para além
da morte". p.83
E segue e me faz seguir e absorver a citação de Spinoza em sua Ética:
"A existência de uma coisa não
pode ser explicada pela duração ou pelo tempo,
mas somente por esta qualidade da eternidade". p.84
Penso no escritor. Seríamos todos,
pois, escritores? Afinal, se vamos à escola aprender a ler e escrever, o que
faz, há muitos, se distanciar da leitura e, principalmente, da escrita. Bom...
conjeturas a parte, quem sabe retomemos em algum momento. Ah! Escritor...
Volto às primeiras
páginas do livro em questão e é quando "um escritor chega às portas do
Céu, o qual, levado à presença de São Pedro, é acusado por este de
"simplificar demais..." p.11. E penso, em meu questionar e me visita
Fernando Pessoa com o que abstraio sendo o poeta um fingidor, que consegue
fingir a própria dor.
Seria realmente
isso? Seria, então, por esta razão que não se busca pela escrita para não ser
acusado? Ser visto? Criticado, copiado ou outros tantos mais? E me rendo à
escrita e me entrego a auto interpretação em que o autor figura-me como aquele
que, ao me encontrar, em meio a milhares de títulos dispostos em estantes bem
organizadas daquele sebo "Outros Contos", da bibliotecária cuidadora
pelos livros que comercializa, passa a enlevar-me através das linha que ao
mesmo tempo que leio, passo a ser partícipe do contexto, quando me percebo
entre as linhas - não mais leitora, mas aprendiz de escritora...
"Outros
Contos" é uma casa em seu formato externo - templo do conhecimento para
muitos que a buscam. Percorro ávida pelo encontro de algum título, autor que
venham saciar minha sede pela leitura que afete meu ser. Salas amplas, estantes
nas paredes, mesas e cadeiras, sobre janelas que se abrem à rua, sofás se
debruçam a preencherem harmoniosamente espaços em que podemos nos aconchegar,
avançar os títulos e nos permanecer enlevados aos temas, às leituras e, quiçá,
torná-lo nosso.
Extasio-me ao
inesperado, tão esperado - Rollo May, conhecido nos era, já nos desvendara
"O Homem a procura de si mesmo", agora, pois, encaminhara-nos à
Beleza e nos propõe "a dimensão artística de nós mesmos e os seres humanos
sobre os quais lemos alguma coisa".
Lembrei-me assim e não me privei ao
registro, de um comentário pela internet, o qual chamou-me especial atenção
donde devemos, por um momento, quem sabe, parar com tanto nos encher de
títulos, mestrado, doutorado, especializações e sairmos a cultivar as praças,
as flores, as pessoas, conversas possíveis e sobretudo, ler Manoel de Barros;
este último, contudo, fora interessante, uma vez que encontramos um livro
seu, jogado na rua e dele nos apropriamos, para casa o trouxemos e fomos ao
encontro em saber que era esse que nos teria legado suas "Memórias
Inventadas" e encontramos o autor mato-grossense que, menino Manoel, fora
levado aos estudos e aos livros e, em suas especulações, ao sentir e pensar que
grandes estudiosos e eruditos pudessem se esquecer do trivial que a vida
proporciona, encontra Albert Einstein a dizer que:
" a imaginação é mais importante do que o saber"
Foi aí que
se deu conta da soberania de Deus em sua engenharia e que, ao homem, não lhe é
concedida a soberania nem para ser um "bentevi" - p.153 Memórias
Inventadas _ Manoel de Barros
Assim é
que o relógio avança o tempo e, nesta manhã fria, o sol se levanta e aquece o
espaço; os afazeres me clamam à realidade; logo mais aula RASC, mas, antes, um
retoque me é significativo para a inspiração que me fora alcançada:
"precisamos enfrentar a história da cultura em que vivemos, nos
movemos e existimos. É esse não ver as coisas em sua dimensão artística que nos
tem feito cegos aos perigos de nosso crescimento fenomenal... ademais
precisamos enfrentar nossa própria arte pessoal, seja qual for. A Arte tem sido
a auto-interpretação dos seres humanos no decurso da história"... Rollo
May p. 13
Assim,
transbordando em ideias, inspirando-me através das palavras dos autores e
poetas, posso deixar o aconchego desta cama, abandonar os cobertores quentinhos
e partir à caminhada que se abre a mim.
Repleta
por boas inspirações, para enfrentar a lida, encerro em agradecimento o acordar
mais uma manhã, entre o café aromático e amoroso que me fora servido, as
leituras dos livros que os tenho ao redor e que tanto puderam inspirar estas
linhas, as quais retornarei em outra manhã. Obrigada Deus.
21/7/2018 - sábado
Após noite
agitada, em que a cabeça latejava em dor constante, o comprimido me levara ao
alívio e sono. A tensão, estresse dos últimos acontecimentos - doença de Élvio,
contratações jovens RASC - desencadearam tensões em meu físico.
Amanheço
livro em mãos. Rollo May continua instigar-me. Suas páginas recheadas de
questões, gritam-me; levam-me a outras tantas páginas. Horas infindas as
imagino numa frase:
"aja como o criador de uma estátua que tem de ser feita bela... " -
Plotino - cap. VIII
Palavras soltas o texto me revela e
me aproprio...
"encontrar forma no caos..." -
p.141;
"a forma é a estrutura não material de nossas vidas, à base da qual
vivemos e sobre a qual baseamos nosso próprio caráter particular". p.142
Mais além...
"a gente está sempre, subconscientemente, no processo de desmanchar
alguma coisa em nossa imaginação, e de repor, em seguida, tudo em seu
lugar...
Ora, tudo isso é uma construção de forma... A forma dita o
conteúdo"...
[Assim...]
"Há
um perigo em se suprimir o caos com demasiada facilidade, pois, com isso, se
remove o estímulo..." - p.144
Imagino, pois:
caos - estímulo - imaginação - criação - forma
caos = fator
estímulo = gerador
imaginação = motivador
criação = instrumentador
forma = realizador
O caos a
se pensar na Criação do Mundo, donde: - A Terra era vazia e sem forma... Penso
no artesão, o novelo de lã, linha. Fio que se mede, que se pesa - inerte numa
caixa, numa estante. Sim, o caos entre tantos novelos, tantas cores, daí o
estímulo para se criar.
E o
desmanchar o que tecido fora - ponto a ponto - encontra o artesão sua frenética
busca pela beleza, pelo gozo do prazer em se tecer e admirar o que está a
tecer; assim, há que se agradar primeiro artesão, artífice de sua obra, para,
depois, tornar público sua criação, quer sobre a mesa, adornando corpos, em
fotos, em fatos.
Assim é
pois que o caos gera sentido e faz sentido e se irmana ao Criador e gera dor de
toda beleza que se pode ver, sentir, imitar. Sim... porque
"A
Terra era vazia e sem forma, mas o Espírito de Deus paivara sobre o
caos"...
Posso, a
partir desse momento, encontrar-me no emaranhado confuso de pensamentos, em
que, por algum momento, o caos me fez companhia, mas, a partir deste instante,
a imaginação pode levar-me além das páginas escritas por Rollo May, para as
minhas próprias escritas.
22/7/2018 - domingo
O vento
frio da manhã adentra janela entreaberta e nos encontra no aconchego entre
cobertas. Amanheço livro. Os capítulos percorridos entre temas, aguçam minha
mente que se vai longínqua, entre memórias - lembranças, quantas fugidias;
saudade que se lança no vazio, em busca dos personagens que não se encontram
mais presentes.
Rolo May
consegue penetrar profundamente nosso interior e dele extrair nosso sentir que
aflora. O culta a beleza, as aulas de Dona Carminda a nos levar a distinguir o
Belo. Sua entonação marcante, elegante, seu sotaque português, penetrante,
loquaz, soa-me ainda agora decorridas décadas desde 1970 até 2018.
A beleza
que minha mãe, a meus olhos de filha deslumbrada, transmitia-me seu porte,
gestos, maneira de falar, de cativar, de agradar, de receber, de partilhar. Seu
sorriso, sua aura angelical sempre em lembrança presente.
Ah o
escritor... Passa a nos desvendar, enquanto desvenda-nos; lança-nos em salas,
como terapias e nos revelamos... Em nós descortinam bastidores que se mantinham
incógnitos, guardados em chaves e afloram sentimentos tais que avançam o palco
em júbilo, em brados e louvores e abrimos gavetas e buscamos memórias que nos
ilustram.
Minha
mãe... O drama da perda da primeira filha, a morte que lhe rondava, soberba,
fria, maldosa, enganosa, jamais lhe fora intimidadora. Vencia batalhas,
fortalecia-se a cada percurso.
Meu pai...
Sempre presente, combatia o combate, entre livros, linhas que declinava,
escrevia o roteiro dos anos por virem - e vieram, viveram, sobreviveram,
venceram.
Jamais
encontrei pai e mãe a reclamarem, blasfemarem as perdas, mas os encontrava
sempre alegres a eleger a vida, os dois filhos que anos depois almejaram trazer
à vida; eram os anos em aberta comunhão, um dia vivido por vez. O agradecer ao
findar do dia; o agradecer e se entregar ao raiar do sol.
Tudo isso
me tornou observadora, embora, quantas vezes, a pouca idade, a infância, a
adolescência não me proporcionaram o devido preparo ao entendimento do presente
que me fora os pais. Entretanto, ainda que no avançar dos anos, em que a
ausência me cala profundamente, reconheço o quanto o Criador me fora gentil ao
me direcionar os pais, irmão, enfim a família que nasci.
Como é
gratificante poder em idade avançar no tempo; tempo que nos propicia
amadurecimento e entendimento.
O
acompanhar em médicos, quando adoeciam, as experiência que adquirimos deles,
tudo a nos compactuar a beleza de se poder admirar o por do sol, o raiar do
dia; ouvir o murmurar das águas, dos pássaros em seus trinos, o roçar a terra,
sentir o cheiro de relva molhada. Quantas manhãs... O balançar da corda
dependurada no galho da ameixeira. O fruto amarelo, doce, suave a molhar
o rosto quando a explodir na boca.
Doce
lembrança meus pais me proporcionaram. Minha infância... O regaço quentinho de
minha mãe a me oferecer seu colo, quando me via acabrunhada. Meu pai a chegar
do trabalho sempre nos presenteando com seus chocolates - e a gaveta da cômoda
se enchia pelos tais; éramos comedidos na gulodice - a mãe orientava-nos à tal,
assim, havia fartura todos os dias...
Bom fora
transportar-me aos anos de infância. A janela em noite fria de junho. O céu
pintado de balões mesclando-se as estrelas as quais podiam-se ver entre a
estrela d'alva, o cruzeiro do sul, as três marias... Hoje não mais as
distinguimos, só em nossa imaginação. As luzes da cidade ofuscaram o brilho
natural do firmamento.
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VIDEOS SOBRE ROLLO MAY E SUA PSICANÁLISE EXISTENCIAL
https://www.youtube.com/watch?v=Trzta8kjwRg - SER-NO-MUNDO
https://www.youtube.com/watch?v=ixwyQkdxYUo - ANSIEDADE E CULPA
https://www.youtube.com/watch?v=DnNNW1TLEPg - CUIDADO, AMOR E VONTADE
https://www.youtube.com/watch?v=dKKkKQ-vQE0 - PSICANÁLISE HUMANISTA EXISTENCIAL